terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

É de bombó

Por estes dias, agora no final de 2008, meu cunhado, Romildo, me explicou que lá em Angola eles comem um tal de funge. Entendi ser uma espécie de pirão, feito de farinha de milho cozida com água, como um angu, mas ralo. Também tem o funge de bombó. E o legal, com sustança mesmo, é o funge de bombó. Pois adivinhem de que é feito o funge de bombó. É de uma farinha de mandioca. Isso foi Romildo quem me disse.

Outra estória lembrei-me no último domingo, almoçando na Torre de TV (Brasília). Comi, pela primeira vez, tacacá e me vieram à mente algumas partes do livrinho do Hans Staden, alemãozinho que visitou o Brasil-Tupi no séc. XVI. O galego Hans foi preso para virar churrasco - literalmente - mas, antes de quase ser comido, teve muitas chances de comer. Ele foi cevado com umas paradinhas de mandioca, descritas no livro com muito entusiasmo gastronômico. Viciou, especialmente numa farinha piladinha com peixe, uma espécie de paçoca de peixe. Além de servir pra armazenar o potreína do peixe sem estragar, a paçoquinha tupi era uma diliça (segundo o Hans). Outras estórias macaxeirísticas estou tendo a oportunidade de acompanhar no "O Banqueiro do Sertão". Recomendadíssimo. Depois volto ao padre de São Paulo, pois essa é outra estória.

O tema disso aqui é: cada civilização tem seu bombó. A cola, que permite às pessoas viverem em cidades, é feita de alguma comida agricultável em larga escala. Mas não adianta só plantar folha de coca em larga escala, tem que ser um troço com muita sustança (leia-se carboidratos). No Egito, Zoropa e Oriente Médio, usavam o trigo. Lá, os chinas e parentes usavam arroz. Ali, no México, a paradinha era de milho, que inclusive virou super-sucesso na Zoropa a partir da introdução e produção em larga escala em terras mediterrâneas, depois dos íberos chegarem por aqui. Por aqui, os tupis, e também os guaranis, se organizavam em volta da produção de mandioca (tinha milho também). E paçoca de carne de gente devia ficar nhumi-nhumi!

Alguém esteve por aqui, provavelmente um português, viciou na paçoquinha dos tupis, e levou pra plantar lá em Angola. Nem precisa dizer que o bombó foi pro topo da lista da alimentação africana em dois tempos. Digo só pra escrever besteira. Afinal de contas, o negócio é resistente, se multiplica com facilidade e qualquer pessoa cultiva. Isso sem falar da alta concentração sustançativa-turbo. Não sei bem qual era o cumê dos africanos, devia existir uma cola pré-bombó por lá. E não era o milho dos xicanos. Feijão? Trigo dos egípcios? Alguém aí exprica, ou adispôi nóis adiscobre.

Por fim, ainda com o tacacá na cabeça, depois de ter lido a receita do tucupi num blog, decidi almoçar hoje no Pátio Brasil. Cássia não podia vir comigo, mas estava disposto a almoçar chique um prato de camarão. Como o estado das coisas tornava propícia a utilização da macaxeira, já subi as escadas rolantes decidido a comer um bobó de camarão. Imediatamente pulou à mente: "Meu Deus!!! Mas o nome é bobó de camarão!!!". Dos tupis foi a mandioca pra África, mas, quando voltou, já era bombó. Voltando ao serviço, estava estendido no gugou... do Kimbundo, a língua das negras do bundão, diretamente de Angola:

Bobó = comida de origem africana: feijão mulatinho, dendê, com inhame ou aipim. *Bobó de camarão = mingau de aipim refogado com camarão, dendê e leite de coco.(Dicionário da Língua Portuguesa de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira)
Mbombo = duro, seco, ressequido. Mandioca fermentada, ou posta de molho para dela se fazer fuba.(Dicionário de Kimbundu-Portuguez coordenado por J.D.Cordeiro da Matta.)

Observação: Não esquecer que o N eo M antes de consoantes, tem somente a função de anasalar estas consoantes que precedem.
Creio que a palavra no Brasil ampliou também o seu significado, servindo para denominar estes pratos típicos.


Será que os camarões são potiguaras!?!?!?!


P.S.: Não havia me tocado, mas a definição acima de bobó deve responder à pergunda da cola africana: inhame. E ainda outro motivo pra rápida disseminação da mandioca em terras africanas. Similaridade.

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